As lanternas estilo japonesas chamadas de Tōrō (esse tracinho acima do “o” para ler se pronuncia com um “o” esticado tipo tooroo) são bem antigas, mas ainda são usadas nos dias de hoje, você as encontrará em entradas de casas, templos, santuários e jardins em todo o Japão. Em japonês se escreve: (灯籠/灯篭/灯楼) que significa ‘cesta de luz’ ou ‘torre de luz’.
Vamos estudar um pouco mais sobre elas hoje?
Assim como muitos objetos da arquitetura japonesa tradicional, as lanternas originaram-se na China e são conhecidas por lá desde a dinastia Han (202 a.C.-220 d.C.) e no período entre 540 e 645 d.C. são as que obtém registros em templos budistas. Elas são um tipo de lanterna tradicional do Leste Asiático feita de pedra, madeira ou metal (tem outro post sobre as de metal no blog). Além da China e Japão também foi bem utilizada no Vietnã.
No Japão, os tōrō eram originalmente usados apenas em templos budistas onde indicavam as estradas e iluminavam os caminhos. As lanternas quando acesas eram consideradas uma oferta a Buda. Seu uso se espalhou e passou a ser usadas em santuários xintoístas também em casas durante o período Nara (710 a 794 d.C.) e Heian (794 –1185). A partir daí se começou a criação de outros modelos de lanternas de pedra, irei citar algumas mais abaixo abordando de um modo geral os ishidōrō ou Ishi-Tōrō (石灯籠, literalmente lanterna de pedra). A lanterna mais antiga de pedra, pode ser encontrada em Taima-dera construída durante o período Nara. Na era Momoyama (1568-1615), os mestres do chá popularizaram as lanternas japonesas de pedra e diminuíram seu tamanho para serem utilizadas como decoração nos pequenos jardins residenciais. Como a cerimônia do chá era realizada ao entardecer, as lanternas tinham a função de iluminar o trajeto dos convidados, tornando-as mais utilitárias. Nos jardins japoneses modernos as lanternas são colocadas ao longo de caminhos apenas para decoração, perto da água ou da bacia de pedra (tsukubai).
Um dos principais centros históricos de produção de lanternas de pedra é na minha cidade vizinha Okazaki em Aichi, a tradicional alvenaria de lá foi registrada pelo governo em 1979 por ser técnica única. Diz-se que essa arte começou em 1590 quando Yoshimasa Tanaka, do Castelo de Okazaki (onde nasceu Tokugawa) encontrou um escultor de lanternas de pedra em Kawachi e Izumi para manter a cidade rasteira do castelo. A cidade ficou famosa pelas esculturas e prosperou devido a condições favoráveis, como conseguir granito de boa qualidade das montanhas próximas e poder carregar lanternas de pedra pesadas para Edo e Osaka usando o rio Yahagi.
Em relação a sua forma, quando olhamos parecem todas iguais (alguns de seus elementos podem estar faltando ou ter algumas adições), assim como como a pagoda, o ishi-dōrō representa os cinco elementos da cosmologia budista. A peça mais baixa, tocando o chão, representa a terra, um kidan (基壇) é um pedaço de pedra em forma normalmente quadrada que é colocado abaixo da base, no chão. A base, chamada kiso (基礎) é geralmente arredondada ou hexagonal, e pode não existir em uma lanterna enterrada. A próxima seção representa a água, o sao (竿) é um poste circular ou quadrado e quase sempre tem uma espécie de “cinto” perto do meio, também podem ser “pernas”. O chūdai (中台) é a plataforma para a caixa de fogo. O fogo é representado pela chama da lanterna, a plataforma para a luz da lanterna é chamada de hibukuro (火袋). As aberturas de luz não se limitam aos padrões geométricos básicos, mas podem incluir meias luas, sol, corações e outras aberturas de figuras. O fogo em si geralmente é produzido pela iluminação de um pavio de óleo. enquanto o ar é representado por um guarda-chuva em japonês chamado de kasa (笠) fica em cima da caixa de fogo. Seus cantos enrolados para cima são chamados de warabide ou warabite (蕨手) e o vazio ou espírito é representados pela parte mais altas e apontando para o céu normalmente se coloca uma flor de lótus no topo antes da jóia, chamada de ukebana (請花) e o remate em forma de uma cebola é chamado de hoju (宝珠, jóia). Estes segmentos têm como significado que, após a morte, o corpo físico de uma pessoa voltará à sua forma original e elementar.
As lanternas de pedra podem ser classificadas em cinco grupos básicos podendo claro, ter outros tipos, aqui listarei as 5 mais comuns:
1) Tachidōrō (立ち灯籠), são as mais comuns. A base está sempre presente e a caixa de luz pode ser decorada com esculturas de veados ou flores, a mais comum é a peônia. São as maiores lanternas, geralmente tem cerca de seis peças empilhadas muito utilizado nos templos e santuários. Não é regra, mas lanternas com o poste em forma redonda são frequentemente construídas no estilo budista e lanternas em forma quadrada no estilo xintoísta. O exemplo mais comum é a Kasuga-dōro (春日灯籠). É originária do Santuário de Kasuga em Nara onde mais de 3.000 lanternas de pedra podem ser acesas em ocasiões especiais.
Esta tradicional lanterna podem ser colocadas em qualquer superfície plana capaz de aguentar seu peso. Neste tipo o guarda-chuva é pequeno e tem seis ou oito lados com os cantos bem curvados. A caixa de luz é hexagonal ou quadrada com esculturas representando veados que são os mensageiros de deus ou o sol ou a lua, no caso de sol e lua têm como significado de que a luz do sol entra durante o dia e a luz do luar entra à noite. A segunda lanterna de pedra mais antiga do Japão, também encontrada no Santuário Kasuga, é uma yūnoki-dōrō ou lanterna de pedra de citroneira que costumava ficar perto da lanterna no Santuário Kasuga. Esse estilo foi criado no período Heian. Seu poste é embelezado com anéis esculpidos na parte inferior, no meio e superior, enquanto sua base hexagonal e plataforma do meio são adornadas com lótus. O guarda-chuva da lanterna é simples, sem ter os cantos enrolados e nem a ukebana. Esse tipo de lanterna se tornou popular nos jardins da casa de chá durante o período Edo.
2) Ikekomi-dōrō (活け込み燈籠) são lanternas de tamanho moderado (mais baixinho) e o poste não repousa sobre uma base, mas vai diretamente para o chão. Por causa de seu tamanho, eles são usados ao longo de caminhos ou com bacias de pedra em jardins. Um exemplo é a Oribe-dōro (織 部 灯籠) este é um tipo de lanterna pensada para o uso do jardim por Furuta Oribe (1544-1615), foi projetada por ele mesmo.
A caixa de fogo é um cubo com uma janela de cada lado: a frente e a traseira são quadradas, a direita e a esquerda têm a forma de lua crescente e a lua cheia. O guarda-chuva é pequeno e de quatro lados e coroada por uma joia (hoju) alongando. O Lorde Oribe era um famoso mestre do chá. Ele estudou com o Sen No Rikyu, mestre dos ensinamentos do “Caminho do Chá” que mudaram profundamente sua apreciação pela vida e toda a cultura do período Edo diante da sua influência.
Também entram nesta categoria a Kirishitan-dōrō (キリシタン灯籠) lanternas com símbolos cristãos ocultos. Esse estilo nasceu durante a perseguição ao cristianismo no Japão, quando muitos continuaram a praticar sua fé em segredo e o Mizubotaru-dōrō (水蛍燈籠) onde sua caixa de fogo tem aberturas quadradas em dois lados voltados e aberturas de triângulo duplo nos outros dois lados. Este tipo de lanterna pode ser visto na Vila Katsura em Kyoto.
3) Oki-dōrō (置き燈籠) receberam sua denominação pelo fato de repousarem simplesmente no solo, sem qualquer sustentação. Esse estilo provavelmente tem suas origens em lanternas suspensas, pois se assemelham, deixadas para repousar no chão. Geralmente são utilizadas ao redor das entradas das casas e ao longo dos caminhos. São pequenas, baixas, discretas e frequentemente colocadas “à beira de um lago, ao lado de um caminho ou em jardins muito pequenos no pátio”.
Um exemplo de lanterna móvel seria o Ozankō-dōrō (三光灯籠), uma pequena caixa de pedra com um telhado baixo. Seu nome, “lanterna das três luzes”, deve-se às suas janelas em forma de sol e lua na frente e atrás, e uma estrela nas extremidades. Esse tipo de lanterna costuma ser posicionado próximo à água. Também pode ser encontrado nos jardins da Villa Katsura!
4) Yukimi-dōrō (雪見燈籠) são lanternas de apreciação da neve, assim chamados por causa da maneira delicada como elas mantêm a neve no telhado que normalmente são bem grandes podendo ser quadrados, hexagonais ou até redondos. São elegantes com uma a seis pernas curvas. Geralmente são baixas e comumente usadas em jardins. Em jardins sempre estará tradicionalmente colocado perto da água. Provavelmente foi desenvolvido durante o período Momoyama, e os exemplos existentes mais antigos são encontrados no Katsura Villa em Kyoto, e remontam ao início do período Edo (século XVII).
A yukimi de uma perna é chamada de Rankei, por sua importância tão integral nos jardins, os japoneses têm um elemento decorativo exclusivo para lago. Uma diferença é o design de seu chapéu (Kasa 笠). Porém, a maior peculiaridade da Rankei é que ela possui seu pedestal curvo, em direção ao lago. Isso para que ela possa refletir sua luz na água, embelezando ainda mais o jardim. A yukimi com duas pernas é chamada de “Kotoji“.
5) Nozura dōrō (野面灯籠) são lanternas feitas com pedras mais naturais, ásperas e não polidas. Inspiradas na estética wabi-sabi que ensina sobre a graciosidade da vida (beleza vinda do natural, imperfeita e impermanente), usando o mínimo de entalhes. Cada lanterna de pedra wabi é única por não serem muito entalhadas e cada pedra ser de um formato. Nesse estilo de jardim, as lanternas japonesas, ficam expostas ao tempo, vão adquirindo musgos e normalmente é usado em jardins de pedra pois o musgo faz com que junto com as pedras normalmente brancas, a estética não mude durante o ano todo e usam de paisagens exteriores para pontuar as estações do ano.
Para ter uma lanterna em casa
Com a mudança do estilo das casas do tradicional para o moderno, surgiram os “Tsubo-Niwa”, que pode ser traduzido como “Jardim Japonês Moderno”. Atualmente a grande maioria das pessoas (principalmente no Japão) não conseguem ter amplos espaços para o seu jardim como as casas antigas, pensando nisso os paisagistas do Japão passaram a adaptar os pequenos espaços com os principais ícones do jardim japonês incluindo a lanterna de pedra, resultando em um jardim que pode ser colocado como jardins de inverno (que dão menos trabalho para o dia a dia), os tradicionais, mas com um toque de minimalismo, sacadas, fachadas etc.
Atenção, pense bem sobre o tamanho!
No Japão, custo do descarte de uma lanterna e a forma de fazer pode ser um pouco trabalhosa, geralmente se você pode carregá-la normalmente se for uma pequena de chão.
Ao visitar a loja Sugitasekizaiten super antiga da cidade de Okazaki (desde 1828) eles ensinaram sobre isso, eu juro, nunca tinha imaginado a trabalheira e o profissionalismo para um descarte. Foi dito que preço de mercado é de uma média de 45 ienes por kg, levando em conta que uma de 120cm pesa uma média de 300kg já fica meio caro. O custo varia ainda dependendo do local que terão que buscar, então você precisa verificar com antecedência para não ter surpresas. O método de processamento das lanternas de pedra é diferente, as vezes dá para aproveitar, dependendo se foi feito de pedra natural ou se é feito artificialmente com concreto, mármores, etc.
Se estiver instalado no jardim e for dos pesados que uma pessoa não possa levantar, deverá ser içado e transportado com um guindaste único ou esmagado primeiro. Algumas lanternas instaladas em jardins têm sido usadas há muito tempo desde os ancestrais da família, então, se for tratado de algo “sagrado” e a família decidir descartar, a empresa ainda faz um ritual para purificar cuidadosamente.
E por último, no Japão tem as lanternas construídas nos túmulos e diz que tem o papel de levar a luz para evitar que o falecido se perca no outro mundo, e o propósito de iluminar a escuridão para se livrar dos espíritos malignos. No entanto, nos tempos modernos, esse significado desapareceu, e o alto design é preferido para melhorar o cenário do túmulo. Interessante, não é?